domingo, 8 de maio de 2016

A NOBREZA DA “COMMON LAW” - Em defesa do Sistema Administrativo de Tipo Britânico (ou de Administração Judiciária)

De: Rodrigo Alexander Davidson de Sousa-Pinto (aluno º 2929)

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A NOBREZA DA
“COMMON LAW”
Em defesa do Sistema Administrativo de Tipo Britânico
(ou de Administração Judiciária)
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Plano


I.      INTRODUÇÃO
     1.     Perspectiva
          a)      Sistema administrativo tradicional
          b)      Sistemas modernos
     2.     O pontapé de partida
II.     O sISTEMA ADMINISTRATIVO DE TIPO BRITÂNICO (OU DE ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA) 
     1.     Revolução ou evolução?
     2.     Características essenciais
          a)      Separação de poderes
          b)      Estado de Direito
          c)      Descentralização
          d)      Sujeição da Administração aos tribunais comuns
          e)      Subordinação da Administração ao direito comum
          f)       Execução judicial das decisões administrativas
          g)      Garantias jurídicas dos particulares
III.   AS VANTAGENS DO SISTEMA DE TIPO BRITÂNICO
IV.   Conclusão
FONTES

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No âmbito das aulas práticas, foi proposto aos alunos da cadeira de Direito Administrativo II que, para trabalho inicial do 2º semestre do ano lectivo 2015-2016, como quem diz, “para início das hostilidades”, se formassem dois pequenos grupos para que, entre eles e perante os restantes colegas de subturma, se “degladiassem” pela defesa de um dos dois sistemas administrativos de direito comparado mais importantes:
·         O sistema administrativo de tipo britânico, ou de administração judiciária; e
·         O sistema administrativo de tipo francês, ou de administração executiva.

Eventualmente, por precipitação, porque o trabalho cairia sobre a pausa da Páscoa, mas por convicção, pela simpatia pelo processo com as origens mais antigas, três de entre os alunos da subturma 7 voluntariámo-nos para a defesa do sistema do tipo britânico. É este que aqui se abordará.




A forma de organização da “res pública” e a forma de actuação desta e peranta esta, foram, à semelhança de toda a organização antropológica, sociológica e, naturalmente, do Direito, sofrendo a evolução da própria história, “em função do tempo e do espaço[i]”.

Para a compreenção do decurso da evolução, no que ao Direito Administrativo diz respeito, tem-se entre nós seguido, maioritariamente, a proposta de distinção de sistemas administrativos em dois tipos de modos jurídicos de estruturação[ii], sendo que um deles se subdivide, por sua vez, em mais dois:

·   Sistema administrativo tradicional




·   Sistema administrativo de tipo britânico (ou de administração directa)
·   Sistemas modernos


·   Sistema administrativo de tipo francês (ou de administraçãoexecutiva)


 Sendo este um trabalho de defesa da perspectiva de um dos sistemas, não compete aqui discorrer sobre os outros. No entanto, convém integrá-lo na realidade administrativa histórica de forma a melhor percebê-lo. E assim, de forma sumária, dir-se-á:

a)   Sistema administrativo tradicional


Foi este o sistema que conhecemos na Europa até aos séculos XVII e XVIII, naturalmente também ele fruto de uma evolução histórica que lhe foi desenhando as características. Tratava-se do sistema administrativo próprio das Monarquias tradicionais europeias, com as variações que em cada Estado foram sendo impressas pela especificidade da sua história e dos seus intervenientes pessoais.

Seguindo a orientação do Prof. Doutor Freitas do Amaral sobre o tema[iii], temos que, e para o presente trabalho isto bastará, as suas duas principais características eram:

               i.          Separação orgânica e funcional rigorosa dos órgãos executivos e judiciais não existente, pelo que as funções administrativa e jurisdicional não surgem diferenciadas:
·         Como se sabe, as funções administrativas e jurisdicionais de topo cabiam ao monarca que as exercia indistintamente;
·         Partindo desta concepção, todos os demais centros de exercício de poder reflectiam essa forma de actuação. Assim, portanto, actuavam também os senhores territoriais, os municípios, os próprios tribunais e delegados régios, enfim, todas as estruturas e centros de poder, quer institucionais quer pessoais;
·         Ou seja, não existia o que hoje chamamos separação de poderes.

             ii.          Inexistência ou insuficiência de garantias jurídicas dos particulares face à Administração por imaturidade ou inexistência do princípio de subordinação da Administração Pública ao princípio da legalidade:
·         Antes do advento dos sistemas modernos impulsionados pelas revoluções liberais no continente europeu, a Administração Pública tinhas um vector, um sentido: de cima para baixo, isto é, funcionava por directivas e instruções de um superior ao seu subalterno e consequente reflexo nos “administrados”;
·         Desta forma, as ordens e normas apenas obrigavam os subalternos perante os seus superiores (dever de obediência), mas sem qualquer vinculação do poder soberano;
·         De igual forma, não havia qualquer concessão (ou conhecimento conceptual) à ideia posterior de direitos dos particulares perante a Administração (que não se confunde com a possibilidade de apelo à autoridade que, de qualquer forma, desconhecia a separação de poderes, como já referido);
·         Ou seja, não havia o que hoje chamamos Estado de Direito.

b)   Sistemas modernos


A situação anterior acaba por declinar para dar origem a novas formas de encarar a Administração Pública, por via das consequências de dois eventos que marcaram o aparecimento dos conceitos modernos de organização do Estado: a “Glorious Revolution” (Grande Revolução de 1688, em Inglaterra) e a Revolução Francesa de 1789.

As consequências destas duas revoluções mudariam para sempre o panorama dos seus próprios países e, por arrasto, os das restantes nações, numa dinâmica que tudo alterou e que está precisamente na origem dos dois conceitos acima referidos como inexistentes ou imaturos na vigência dos regimes anteriores: Separação de Poderes e Estado de Direito.

Como ensina ainda o Prof. Doutor Freitas do Amaral[iv], a Declaração do Direitos do Homem e do Cidadão surgida com a Revolução Francesa de 1789, no seu artigo 16º sublinha logo que “toda a sociedade na qual a garantia dos direitos não esteja assegurada, nem a separação dos poderes determinada, não tem Constituição”. Mas, já antes, a “Bill of Rights” de 1689[v], vinha assegurar o limite ao poder do monarca assim como a sujeição de determinadas matérias à competência exclusiva do parlamento, para além de um conjunto de direitos e liberdades transpostos para a letra da lei. Veio o desenvolvimento desta realidade a ser conhecido como “a rule of law”, o primado do direito.


Como acima visto, esta nova conceptualização da vida em sociedade, do próprio Estado, enfim, do Homem, vem alterar profundamente o sistema de Administração Pública, pois vem submetê-lo a normas jurídicas condicionadas pela sua própria obrigatoriedade e imparcialidade ao estender a todos os cidadãos a sua aplicabilidade de forma igual e no respeito pelos recém-encontrados direitos humanos.

Estava, pois, dado o “pontapé de partida” para o desenvolvimento de perspectivas diferentes sobre o funcionamento do Estado, suas instituições, poderes e relação deste com os particulares e vice-versa.

Mas, assim como nasceram de formas diferentes, também a organização dos sistemas sociojurídicos e por consequência dos sistemas administrativos em cada uma destas nações onde primeira se manifestaram as novas ideias, veio a ser diferente. Assim surgiu o sistema administrativo de tipo britânico (ou de administração judiciária) e o de tipo francês (ou de administração executiva).

Aqui chegados, cumpre agora olhar para o sistema de tipo britânico e proceder, como proposto, à sua defesa como aquele que importa maiores qualidades e aptidões de defesa do interesse dos privados perante os interesses públicos, assegurando, ainda assim, que a prossecução do interesse público é sempre feita na medida do interesse colectivo.



Ao contrário do direito francês, o direito britânico, historicamente, avança muito mais de forma evolutiva do que por grandes saltos de impulso revolucionário. Ou, talvez seja preferível dizer, é capaz de dar avanços evolutivos mantendo a sua carga histórica e características de formação e manutenção consuetudinária.


As fases mais violentas da evolução, com origem nas experiências essencialmente inglesas, não provocam cortes abruptos e sem regresso ao passado ou, pelo menos, aspectos do passado. Não quer isto dizer que não sejam alterações sem violência. Pelo contrário. Muitas das alterações mais significativas nas ilhas britânicas tiveram origem em manifestações de grande violência ou de grave conflito, incluindo a execução do monarca. Mas, ou não houve completa ruptura com o passado ou, havendo, foi sempre possível manter os laços e as características suficientes para que dele se recuperassem importantes aspectos de identidade cultural, social e legal. Numa ou noutra perspectiva, assim aconteceu com os grandes momentos formadores da identidade do direito britânico e do seu panorama constitucional: assim veja-se e entenda-se a Magna Carta (Magna Charta Libertatum, de 1215; a Guerra Civil inglesa que originou a Comunidade da Inglaterra de Oliver Cromwell de 1649 a 1660 (único período dito republicano); a já referida “Glorious Revolution” de 1688 na origem da “Bill of Rights” de 1689[vi].

Ora, todos estes passos históricos vieram provocar a evolução do sistema inglês, posteriormente britânico. Não uma grande revolução desintegradora de um antigo regime e fundadora de um integralmente novo, mas passos fortes, contundentes e muitas vezes violentos, mas ainda assim numa direcção com suficiente continuidade histórica para que possamos falar numa longa e antiga cadeia de evolução do direito britânico. Como melhor resume ainda o Prof. Doutor Freitas do Amaral[vii], “Conhecem-se os aspectos fundamentais do direito anglo-saxónico em geral: lenta formação ao longo dos séculos; papel destacado do costu­me como fonte de direito; distinção entre common law e equity; função primacial dos tribunais na definição do direito vigente («remedies precede rights»); vinculação à regra do precedente; grande independência dos juízes e forte prestígio do poder judicial”.


Em resultado da evolução a que se aludiu, foi-se formando, como consequência, este sistema administrativo de pendor judiciário de tipo britânico.

De forma muito vincada, ela apresenta como características essenciais os resultados das causas históricas referidas (entre outras). E, continuando no mesmo sentido esquemático adoptado na lição do Prof. Doutor Freitas do Amaral, essas características são:

a)   Separação de poderes


O Rei foi remetido a um papel próprio, perdendo a capacidade de, por si ou através de intermediários singulares ou mesmo colectivos (v.g. conselhos), poder resolver conflitos, isto é, de julgar. Perdeu também, em 1701 pelo Act os Settlement, a possibilidade de dar ordens aos juízes ou de ter qualquer palavra na sua colocação, transferência, exoneração ou demissão. O poder judicial separava-se definitivamente do Rei.

b)   Estado de Direito


O que os franceses conheceriam abruptamente só no século XVIII, os ingleses primeiro e depois os britânicos, vieram experimentando gradualmente, desde 1215 com a Magna Charta e até à “Bill of Rights”, o que foram sendo os seus direitos, liberdades e garantias. Este processo veio submeter o Rei ao direito. Mas, veio igualmente submeter os súbditos, qualquer que ele fosse e qualquer que fosse a sua condição. Veio dar início ao primado da lei, a “rule of law”. O direito comum passava a existir com uma aplicabilidade universal (a todos os ingleses e residentes no seu território). E, veio darconceder-se aos costumes sancionados pelos tribunais (ainda “common law”) uma validade de tal forma marcante que hoje se associa de imediato o direito consuetudinário ao direito de cariz ou de inspiração britânico.

c)      Descentralização


Desde muito cedo os ingleses fizeram a distinção entre a administração central (“central government”) e administração local (“local government”), não sendo esta vista como uma emanação daquela, mas como uma verdadeira administração autónoma e de governo local. São os counties, boroughs, parishes, districts e outras formas locais de governo e organização administrativa local.

d)   Sujeição da Administração aos tribunais comuns


A Administração Pública, seja central ou local, seja directa ou indirecta, seja qual for a designação que se lhe dê ou característica de que se revista, está sempre submetida ao controlo jurisdicional dos tribunais comuns, os “courts of law”. Este, é um corolário coerente do princípio da igualdade de todos, cidadãos, instituições ou administração, perante a lei. Assim, os litígios que surjam entre iguais, são julgados por igual, no sentido de que são todos da competência dos tribunais comuns.

e)   Subordinação da Administração ao direito comum


Ainda antes da resolução de conflitos, a convivência faz-se pela aplicação e vigência de um direito igual para todos, Rei, cidadãos e administração. É uma clara consequência da “rule of law”. Todos se regem pelo mesmo direito, que é comum a todos, e é a “common law of the land”.

f)    Execução judicial das decisões administrativas


Ainda corolário das características anteriores é a falta de coercibilidade própria da administração. Isto é, a administração não pode impor e executar as suas decisões sem a colaboração voluntária dos cidadãos e demais partes iguais perante o direito. À inobservância de uma deliberação da administração, está-lhe reservado exclusivamente o acesso aos tribunais para a fazer valer.

g)   Garantias jurídicas dos particulares


Mas, apesar da igualdade perante a lei, o sistema reconhece que a administração detém um poder superior ao de um cidadão isolado, que lhe advém da sua própria natureza. E, neste sentido, aos cidadãos é-lhes garantido o acesso a um sistema de garantias contra eventuais ilegalidades e abusos da Administração Pública. Isto é, reconhecendo a lei que alguma autoridade deve ser atribuída à Administração, sob pena de a paralisar, estes poderes (de autoridade) são atribuídos aos órgãos administrativos como que equiparados a tribunais inferiores. Daqui resulta que, em caso de abuso ou excesso, o particular afectado pode recorrer a um tribunal superior. A este, normalmente o “King’s Bench”, é pedido pelo particular um “mandado” (“writ”) ou uma “ordem” (“order”) dirigido à Administração ou ao seu órgão em causa, para que faça ou deixe de fazer o que quer que seja que esteja em causa. Mas, este procedimento não exclui a jurisdição dos tribunais comuns. Pelo contrário, ela é plena, pelo que estes actuam perante a Administração Pública como o fazem perante qualquer particular, seja cidadão, entidade ou empresa. Caso a ordem ou mandado emitido não sejam cumpridos, a lei trata essa desobediência como um ilícito criminal, pelo que prevê penas de prisão para o titular administrativo.




Não competindo aqui a análise do sistema de tipo francês, podemos, no entanto, estabelecer o que são as vantagens capazes de atribuir uma preferência no plano teórico ao sistema de tipo britânico, pela sua maior definição e sujeição ao teste do tempo e da sua aplicabilidade global.

Estas vantagens, acabam por se traduzir nos elementos diferenciadores de cada tipo de sistema, que se estabeleceram para além da óbvia e incontornável característica comum que partilham: Separação de Poderes e o Estado de Direito.

A partir daqui, subsistem as diferenças que, no âmbito deste trabalho, configuram uma superioridade prática do sistema de matriz britânica. Senão, veja-se:

·         Organização administrativa: o sistema de tipo britânico mantem o resultado evolutivo que o caracteriza como sendo descentralizado, mantendo-se o de tipo francês essencialmente centralizado (apesar de aspectos evolutivos recentes em ambos os sistemas, que centralizam alguns aspectos no primeiro e descentralizam outros aspectos no segundo). Esta descentralização apresenta-se como uma vantagem de proximidade e intimidade na relação da Administração com os cidadãos (que aliás resulta na preferência da utilização da expressão cidadãos à expressão de administrados);
·         Controlo jurisdicional da Administração: os sistemas de tipo britânico mantêm a vantagem da jurisdição dos tribunais comuns para os conflitos administrativos enquanto os de tipo francês mantêm a especialidade dos tribunais administrativos. A percepção dos cidadãos é pois diferente num e noutro sistema: no primeiro estes estão em pé de igualdade perante um tribunal comum. No segundo, a especialidade dos tribunais colocam o cidadão numa posição de diferença procedimental, conceptual e de percepção perante a Administração, precisamente pela especialidade jurisdicional.
Note-se que o recente impulso dado nos sistemas de tipo britânico aos chamados administrative tribunals não nos deve levar a achar que estamos perante um recente desenvolvimento de uma especialização jurisdicional. Pelo contrário, é aos tribunais comuns (courts of law) que compete julgar os casos de índole administrativa. Estes “administrative tribunals” surgem, nos diversos panoramas de influência britânica, não como especialização processual, mas ou como agências governamentais nuns casos, ou como órgãos administrativos independentes (para tomadas de decisão de direito administrativo de resolução por critérios estritos de legalidade, de grande objectividade) e noutros ainda como alternativa arbitrária ao recurso aos tribunais comuns (ou seja, antes do recurso aos tribunais comuns, em razão da matéria nuns casos, ou por decisão das partes noutros, sujeitam-se as partes à aplicação do direito administrativo de forma objectiva ou podem as partes aceitar dirimir o seu conflito ou matéria em causa numa espécie de comissão arbitral - ainda que se submetam à decisão vinculativa e portanto de carácter jurisdicional, as partes fazem-no por acordo de vontades à sujeição da decisão e não por imperatividade do recurso a estes “tribunals”): é nisto que se consubstanciam, na sua essência, os “administrative tribunals” e não em especialização de tribunais comuns em tribunais administrativos[viii]. Apenas uma confusão linguística poderia levar-nos a pensar que o sistema de tipo britânico estaria a perder uma das suas grandes vantagens.
·         Direito aplicável (regulador): nos sistemas de tipo britânico o direito aplicável é o direito privado, o direito comum, a common law. Nos sistemas de tipo francês, aplica-se o direito administrativo, isto é, direito público.
·         Executoriedade das decisões administrativas: esta é uma característica que se encontra igualmente na própria expressão definidora dos dois tipos de sistemas (administração de tipo britânico ou judiciária e de tipo francês ou executiva), pois à primeira a execução depende de sentença de um tribunal (comum) e a segunda, por ser de administração executiva faz depender as decisões administrativas da autoridade da própria Administração sem necessidade de recurso prévio aos tribunais.
·         Garantias dos cidadãos / particulares: estando a Administração sujeita e subordinada aos tribunais em pé de igualdade com os cidadãos, estes exercem um poder injuntivo sobre uns e outros, concedendo assim um reforço da importância da petição de uns contra os outros (ou a favor) sempre em pé de igualdade, atribuindo um reforço das garantias dos particulares quando comparadas com as existentes em sistemas executivos (tipo francês). Ora nestes últimos, a Administração sendo independente do poder judicial, só no limite (salvo por mecanismos internos como por exemplo o recurso hierárquico) e só por condenação judicial (v.g. anulação de decisões ou condenações indemnizatórias) e por tribunais administrativos, poderá o particular ver garantidos os seus direitos.




A evolução do sistema britânico colocou-o numa real e eficaz situação de igualdade da Administração Pública perante a lei. De tal forma, que compete aos tribunais comuns dirimirem os eventuais conflitos sem que existam tribunais, órgãos ou processos especiais. É uma verdadeira conquista da lei comum, da lei da terra. Cabe aos tribunais comuns, portanto, exercer o controlo sobre a administração, como sobre os particulares, pela verificação em sede de conflito ou disputa da conformidade à lei. Independentemente de vectores de desenvolvimento de aproximações paulatinas entre ambos os sistemas que parecem verificar-se recentemente, estes não permitem despir a essencialidade das características de ambos os sistemas. Eles mantêm-se diferentes e, julgo, pelas características expostas, com enormes vantagens para os cidadãos nos sistemas de tipo britânico, pelo exposto.

Em países que derivam e evoluíram a partir do direito num país, o Reino Unido, onde permanecem solidamente instituições e realidades próprias de uma monarquia, com uma muito particular aristocracia, não deixa de ser uma característica de grande nobreza da lei comum que essas diferenças de cariz social não tenham, perante a lei, qualquer relevância prejudicial entre os cidadãos.
Apetece pois dizer, que é curioso (mas inevitável pela própria natureza do sistema) que com origem na terra das diferenças sociais, os intervenientes no processo administrativo sejam iguais perante a lei. É a rule of Law. É a vantagem do sistema de tipo britânico.

Não deixa de ser igualmente curioso, pelo exposto, que nos sistemas de inspiração na terra da Liberté, Egalité et Fraternité os intervenientes no processo administrativo sejam... dependentes, desiguais e pouco fraternos!






·       FREITAS DO AMARAL, Diogo; Curso de Direito Administrativo, Livraria Almedina, Vol.1, ed. 2015
·       Administrative justice reform (https://www.gov.uk/government/policies/administrative-justice-reform )




[i] Como a propósito da estruturação da Administração Pública refere o PROF. DOUTOR FREITAS DO AMARAL,, in Curso de Direito Administrativo, Almedina, 4ª edição, 2015, vol. I pág. 87,
[ii] Idem.
[iii] PROF. DOUTOR FREITAS DO AMARAL,, in Curso de Direito Administrativo, Almedina, 4ª edição, 2015, vol. I pág. 88
[iv] PROF. DOUTOR FREITAS DO AMARAL,, in Curso de Direito Administrativo, Almedina, 4ª edição, 2015, vol. I pág. 89.
[v] A Declaração de Direitos de 1689 (em inglês Bill of Rights of 1689) é um acto do parlamento inglês que assegurou em 16 de Dezembro de 1689, a passagem para a forma de lei do que havia sido a Declaração de Direito apresentado pelo parlamento (o “English Convention Parliament”) a Guilherme de Oranje-Nassau e mulher, convidando-os a tornarem-se soberanos ingleses e estabelecendo, desde logo, limites ao poder dos monarcas e poderes parlamentares, para além de tornar vinculativas as sessões parlamentares regulares, obrigatoriedade de aprovação e revogação das leis pelo parlamento, exclusividade parlamentar para a aprovação de impostos, direito de petição ao monarca sem possibilidade de represálias, eleições livres e liberdade de expressão parlamentar, e integrando legalmente conceitos como o da liberdade (nomeadamente a liberdade dos protestantes para deterem armas de defesa, nos limites da lei), a propriedade privada, etc.
[vi] São estas referências, juntamente com o Petition of Right de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679, os Parliament Acts de 1911 e1949 considerados momentos e documentos básicos da constituição britânica não escrita e consuetudinária.
[vii] PROF. DOUTOR FREITAS DO AMARAL,, in Curso de Direito Administrativo, Almedina, 4ª edição, 2015, vol. I pág. 90.
[viii] Ver, por exemplo: Reino Unido - Administrative justice reform (https://www.gov.uk/government/policies/administrative-justice-reform ) / Canadá - Administrative Tribunals (http://www.thecanadianencyclopedia.ca/en/article/administrative-tribunals/ ) / Índia - THE ADMINISTRATIVE TRIBUNALS ACT, 1985 (http://cgat.gov.in/act.htm ou http://persmin.nic.in/DOPT/Acts_Rules/ATA/Acts/ATA_Acts_1_ACT1985.pdf) /


De: Rodrigo Alexander Davidson de Sousa-Pinto (aluno º 2929)

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