segunda-feira, 18 de abril de 2016

Algumas considerações acerca de discricionariedade imprópria
A discricionariedade consiste numa liberdade de apreciação concedida a um órgão administrativo, permitindo que este escolha, numa série de comportamentos possíveis, aquele que lhe pareça mais adequado à satisfação da necessidade pública específica prevista na lei.
O processo de escolha por parte da administração terá de ser ditado pelos princípios e regras gerais que vinculam a administração, porque só deste modo se conseguiria constatar que se encontra a melhor solução na prossecução do interesse público. Estes factos conduzem-nos à conclusão que o Prof. Freitas do Amaral defende que o poder discricionário não é um poder livre mas sim um poder jurídico. Desta forma, a lei ao atribuir a determinado órgão poder discricionário pretende propositadamente que seja encontrada a solução que concretize os princípios da boa fé, da imparcialidade, da igualdade, proporcionalidade, etc.
Estamos portanto perante uma discricionariedade própria quando nos encontramos perante uma posição em que a administração tem o poder de tomar uma acção ou escolha sem estar devidamente limitada. Desta forma, devemos falar também de uma discricionariedade imprópria, que são aquelas situações em que a administração não se deva considerar autorizado a escolher livremente entre várias soluções possíveis, mas antes obrigado a procurar a única solução adequada que o caso comporta.
Nos casos de discricionariedade imprópria, a priori há uma margem de apreciação, mas no momento decisório que o caso comporta haverá apenas uma única solução adequada.
Existem para o prof. Freitas do Amaral três modalidades de discricionariedade imprópria: a discricionariedade técnica, a liberdade probatória e a justiça administrativa.
Casos há em que as decisões da Administração só podem ser tomadas com base em estudos prévios de natureza técnica e segundo critérios extraídos de normas técnicas. O “dever de boa administração”.
Duas observações complementares:
A primeira para sublinhar que a figura da discricionariedade técnica, não se confunde com a liberdade probatória. Embora ambas se reconduzam a um género comum – o da discricionariedade imprópria –, a verdade é que se trata de espécies diferentes. Porque a discricionariedade técnica reporta-se à decisão administrativa, ao passo que a liberdade probatória tem a ver com a apreciação e valoração das provas relativas aos factos em que se há-de apoiar a decisão.
Há, todavia, um caso limite, em que, por excepção a esse princípio geral, a nossa jurisprudência admite a anulação jurisdicional de uma decisão técnica de Administração: é a hipótese de a decisão administrativa ter sido tomada com base em erro manifesto, ou segundo um critério ostensivamente inadmissível, ou ainda quando o critério adoptado se revele manifestamente desacertado e inaceitável. O Tribunal Administrativo pode anular a decisão tomada pela Administração – embora não possa nunca substitui-la por outra mais adequada.
A liberdade probatória, é quando a lei dá à Administração a liberdade de, em relação aos factos que hajam de servir de base à aplicação do Direito, os apurar e determinar como melhor entender, interpretando e avaliando as provas obtidas de harmonia com a sua própria convicção íntima.
A Administração Pública, no desempenho da função administrativa, é chamada a proferir decisões essencialmente baseadas em critérios de justiça material.
A Administração Pública não pode escolher como quiser entre várias soluções igualmente possíveis: para cada caso só há uma solução correcta, só há uma solução justa.
Mas esta terceira modalidade, a justiça administrativa, não é apenas a mistura entre liberdade probatória e discricionariedade técnica. Há um terceiro ingrediente neste tipo de decisões da Administração Pública, que faz a especificidade desta terceira categoria, e que é o dever de aplicar critérios de justiça. Critérios de justiça absoluta, e de justiça relativa.
Nestes casos não há discricionariedade, porque não há liberdade de escolha entre várias soluções igualmente possíveis, há sim uma margem de livre apreciação das provas com obrigação de apurar a única solução correcta.
Como consideração final podemos constatar que na actualidade não se fala de discricionariedade imprópria nos termos que eram detalhados antigamente. Sendo que, por exemplo, em casos de justiça administrativa não estaremos nós face a um verdadeiro acto de discricionariedade? A distinção tem interesse porque, tratando-se de figuras cuja natureza jurídica é diferente da do poder discricionário, é perfeitamente possível que no futuro elas venham a ter um regime jurídico diferente do regime do poder discricionário.

Publicado por Lea da Fonseca 



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