Faculdade de Direito
Universidade de Lisboa
O ATO ADMINISTRATIVO
Discente: Adriana
C. Pissarra
Docente: Jorge Miguel Pação
Direito Administrativo II
Lisboa Abril 2016
1.
CONCEITO, NATUREZA E ESTRUTURA
A noção de ato
administrativo vai servir para definir as atuações da Administração Pública
submetidas ao controle dos Tribunais Administrativos.
O ato administrativo é
um conceito que funciona ao serviço do sistema de garantias dos particulares.
Podemos dizer que o ato administrativo serve como garantia da Administração e também
como garantia dos particulares.
A principal função
prática do ato administrativo, é a de delimitar comportamentos suscetíveis de
fiscalização contenciosa, por isso resulta do art. 268º/4 CRP.
O ato administrativo
surge para delimitar os comportamentos da Administração que são suscetíveis de recurso
contencioso como garantia dos particulares.
2.
DEFINIÇÃO
DE ATO ADMINISTRATIVO
Os elementos do
conceito do ato administrativo são:
a. Trata-se de um ato jurídico;
b. Trata-se de um ato unilateral;
c. Trata-se de um ato organicamente
administrativo;
d. Trata-se de um ato materialmente
administrativo;
e. Trata-se de um ato que versa
sobre uma situação individual num caso concreto.
Podemos dizer que o ato
administrativo, é o ato jurídico unilateral praticado por um órgão de
Administração no exercício do poder administrativo e que visa a produção de
efeitos jurídicos sobre uma situação individual num caso concreto.
O Código do Procedimento Administrativo
usa o termo “ato” tanto no sentido amplo, mais corrente na doutrina (art. 1º
Nº1 CPA), em que se considera o procedimento administrativo uma sucessão
ordenada de factos. Mas também num mais restrito, em que o ato se confunde com
a decisão, surgindo como a conclusão do procedimento (art. 148º CPA).
3. ATO JURÍDICO
O ato administrativo,
é um ato jurídico com uma conduta voluntária.
Dentro dos factos
jurídicos em sentido amplo figuram várias realidades como os atos jurídicos,
sendo que o ato administrativo é um ato jurídico.
Por isso são, em
regra aplicáveis ao ato administrativo, os Princípios
Gerais de Direito referentes aos atos jurídicos em geral.
4. ATO UNILATERAL
Aqui temos uma
classificação conhecida dos atos jurídicos: atos unilaterais e atos bilaterais.
Ao dizermos que o ato
administrativo é unilateral,
pretende-se referir que ele é um ato jurídico que provém de um autor cuja
declaração é perfeita independentemente do concurso das vontades de outros
sujeitos.
Em alguns casos, a
eficácia do ato administrativo depende da aceitação do particular interessado,
mas essa aceitação funciona apenas como condição de eficácia do ato – não íntegra o conceito do próprio ato.
Ex: Ato de nomeação de um
funcionário público – é um ato unilateral.
5. ATO PRATICADO POR UM ÓRGÃO DA
ADMINISTRAÇÃO
Os órgãos da
Administração Pública praticam atos administrativos e não há atos
administrativos que não sejam provenientes de órgãos da Administração Pública.
Os indivíduos que por
lei ou delegação de poderes têm aptidão para praticar atos administrativos são
órgãos da administração e as nossas leis denominam-nos também como autoridade
administrativa.
Daqui resulta os que
não cabem no conceito de ato administrativo:
a) Os atos praticados por órgãos que não integram a Administração
Pública nomeadamente, as pessoas coletivas de utilidade pública
administrativa e as empresas de interesse coletivo. Estas entidades apesar de
colaborarem com a Administração Pública, não
fazem parte dela e não a integram. Mas em algumas situações é admitido que
as pessoas coletivas de utilidade pública administrativa e as empresas concessionárias
possam praticar “atos administrativos”, contenciosamente recorríveis.
b) Também não são atos
administrativos os atos praticados por indivíduos estranhos à Administração
Pública. É o caso dos usurpadores de funções públicas.
c) Por último, não são atos
administrativos, os atos jurídicos praticados por órgãos do Estado integrados
no poder moderador, no poder legislativo ou no poder judicial.
6. EXERCÍCIO DO PODER ADMINISTRATIVO
Só os atos praticados
no exercício de um poder público e para o desempenho de uma atividade administrativa
de gestão pública – só estes é que são atos administrativos.
Consequência:
a) Não são atos administrativos os atos
jurídicos praticados pela Administração Pública no desempenho de atividade de
gestão privada;
b) Também não são atos
administrativos os atos políticos, os atos legislativos e os atos
jurisdicionais ainda que praticados por órgãos da Administração;
7. O PROBLEMA DOS CHAMADOS ATOS
COLECTIVOS, PLURAIS E GERAIS
Em primeiro lugar há
os chamados “atos coletivos”, isto
é, os atos que têm por destinatários um conjunto unificado de pessoas.
Depois temos os “atos plurais” que são aqueles em que a
Administração Pública toma uma decisão aplicável por igual a várias pessoas
diferentes.
Por último, aparecem
os chamados “atos gerais”, que são
aqueles que se aplicam de imediato a um grupo inorgânico de cidadãos e todos
eles são bem determinados, ou até determináveis no local.
8. IMPORTÂNCIA DO ATO ADMINISTRATIVO
NO ESTUDO DO DIREITO ADMINISTRATIVO
O ato administrativo,
é uma grande novidade que o Direito Administrativo traz à ordem jurídica. De
facto, normas jurídicas e contratos já o eram há muito, figuras habituais no
mundo do Direito.
Agora, o ato unilateral de autoridade é que é
a figura típica do Direito Administrativo e foi para reagir contra ele – se for
ilegal – que existe um remédio especialmente criado pelo Direito
Administrativo, destinado a proteger os direitos dos particulares ou os seus
interesses legítimos, que é o recurso
contencioso de anulação.
O Direito
Administrativo nasce para garantir aos particulares a possibilidade de
recorrerem aos Tribunais contra os atos administrativos ilegais que o prejudicam.
9. CARACTERÍSTICAS DO ATO ADMINISTRATIVO
É importante distinguir,
a este propósito, as características comuns a todos os atos administrativos,
das características específicas, do tipo mais importante de ato administrativo,
que é o ato definitivo e executório.
As características
comuns a todos os atos administrativos
são seis:
a)
Subordinação à lei: nos termos do
princípio da legalidade, o ato administrativo tem de ser em tudo conforme com a
lei, sob pena de ilegalidade.
b)
Presunção de legalidade: é o efeito
positivo do princípio da legalidade. Porque o ato é emanado de um órgão da
Administração de autoridade, e porque é exercício de um poder público regulado
pela lei, presume-se legal até decisão em contrário do Tribunal competente.
c)
Imperatividade: é uma consequência
da característica anterior. Devido à origem e por se presumir conforme à
legalidade vigente, o ato administrativo goza de imperatividade, isto é, o seu
conteúdo é obrigatório para todos aqueles aos quais o ato seja eficaz, tanto
para os funcionários públicos que tenham de dar execução, como para os
particulares que o tenham de acatar.
d)
Revogabilidade: o ato administrativo
é por natureza revogável pela Administração. Porque a sua função é prosseguir o
interesse público, e este é eminentemente variável. O ato administrativo é por
essência revogável, o que permite à Administração ir modificando os termos em
que os problemas da sua competência vão sendo resolvidos, de harmonia com as
exigências mutáveis do interesse público.
e)
Sanabilidade: o ato ilegal é suscetível
de recurso contencioso e, se for anulável, pode ser anulado pelo Tribunal
Administrativo. Mas, se ninguém recorrer dentro dos prazos legais, a ilegalidade
fica sanada e o ato convalida-se.
f)
Autoridade: consequência do poder de
decisão unilateral da Administração, que se traduz na obrigatoriedade do ato
administrativo para todos aqueles relativamente a quem ele produza os seus
efeitos.
Para além destes
princípios, importa salientar as três
principais características específicas do ato administrativo definitivo e
executório:
• Condição necessária do uso da força: a
Administração não pode fazer uso da força sem primeiro ter adquirido a legitimidade
necessária para o efeito, praticando um ato definitivo e executório. Sem ato
definitivo e executório prévio, não é possível recorrer ao uso da força;
• Possibilidade de execução forçada: o ato
definitivo e executório, se não for acatado ou cumprido pelos particulares,
pode em princípio ser-lhes imposto pela Administração por meios coativos. É uma
consequência do privilégio de execução prévia;
• Impugnabilidade contenciosa: o ato definitivo
e executório é suscetível de recurso contencioso, no qual os interessados podem
alegar a ilegalidade do ato e pedir a respetiva anulação. Por via de regra, os atos
que não sejam definitivos e executórios não são suscetíveis de recurso
contencioso perante os Tribunais Administrativos. A impugnabilidade contenciosa é, assim, uma característica específica dos atos administrativos definitivos e
executórios.
10. NATUREZA JURÍDICA DO ATO
ADMINISTRATIVO
Para uns o atamos
administrativo tem um carácter de negócio jurídico, e deve por isso ser
entendido como uma espécie do género negócio jurídico, a par da outra espécie,
sua irmã, do negócio jurídico privado.
Para outros, o ato
administrativo é um ato de aplicação do Direito, situado no mesmo escalão e
desempenhando função idêntica à da sentença.
Para uma terceira
corrente de opinião, enfim, o ato administrativo não pode ser assemelhado, nem
ao negócio jurídico, nem à sentença, e portanto ser encarado como possuindo
natureza própria e carácter específico, enquanto ato unilateral de autoridade
pública ao serviço de um fim administrativo.
O ato administrativo
não se deixa reconduzir nem ao negócio jurídico, nem à sentença, pela mesma
razão porque a atividade administrativa, se distingue claramente tanto da atividade
privada como das demais atividades públicas, nomeadamente da jurisdicional.
O ato administrativo
tem assim uma natureza própria, específica, privativa, que dele faz figura sui generis na ordem jurídica – a figura
do “ato
unilateral de autoridade pública ao serviço de um fim administrativo”.
Atendendo ao carácter
sui generis do ato administrativo
somos levados a concluir as seguintes orientações:
a)
O regime jurídico do ato administrativo é o que consta da lei e da
jurisprudência administrativa, e corresponde à natureza sui generis do ato administrativo;
b)
Se outra coisa não resultar da sua natureza específica de atos administrativos,
podem aplicar-se supletivamente aos atos discricionários as regras próprias do
negócio jurídico como ato intencional indeterminado;
c)
Com idêntica ressalva, podem aplicar-se aos atos vinculados as regras próprias
da sentença como ato de aplicação da norma geral e abstrata a uma situação
individual e concreta.
11. O PAPEL DA VONTADE NO ATO
ADMINISTRATIVO
No plano da interpretação do ato
administrativo se o ato corresponde ao negócio jurídico, o elemento
decisivo da sua interpretação é o apuramento da vontade psicológica (real) do
seu autor. Mas se o ato corresponde à sentença, o elemento decisivo da sua
interpretação é a lei e o tipo legal de ato que ela mandava praticar.
Quanto ao plano dos vícios da vontade que afetem
o ato administrativo, os que encaram o ato como um negócio jurídico não
consideram que os vícios da vontade (erro, dolo, coação), geram ilegalidade do ato
mas, a defesa da relevância direta desses vícios como verdadeiros vícios da
vontade e, portanto, como fonte autónoma de invalidade. Já os que concebem o ato
administrativo como sentença defendem que os vícios da vontade não revelam
enquanto tais, mas tão-somente na medida em que geram a ilegalidade do ato.
O papel da vontade no
ato administrativo não é idêntico ao papel da vontade no negócio jurídico ou na
sentença, e por isso reclama uma consideração própria e singular, de harmonia
com o perfil sui generis do ato
administrativo, enquanto ato unilateral de autoridade pública ao serviço de um
fim administrativo.
12. ESTRUTURA DO ATO ADMINISTRATIVO
A estrutura do ato
administrativo, compõe-se de quatro
ordens de elementos: subjetivos, formais, objetivos e funcionais:
a)
Elementos subjetivos: o ato administrativo típico põe em relação dois
sujeitos de direitos a Administração Pública e um particular ou, em alguns
casos duas pessoas coletivas públicas. O autor, em regra um órgão de uma pessoa
coletiva pública; destinatário, um particular ou uma pessoa coletiva pública.
b)
Elementos formais: todo o ato administrativo tem sempre necessariamente uma
forma, isto é, um modo pelo qual se exterioriza ou manifesta a conduta
voluntária em que o ato consiste (art. 150º CPA). É assim que os atos
administrativos podem ter a forma de decreto, de portaria, de despacho, de
alvará, de resolução além da forma do ato administrativo, há ainda a assinalar
as formalidades prescritas pela lei para serem observadas na fase da preparação
da decisão, ou na própria fase da decisão. Consideramos formalidades e todos os
trâmites que a lei manda observar com vista a garantir a correta formação da
decisão administrativa ou o respeito pelos direitos subjetivos e interesses
legítimos dos particulares.
c)
Elementos objetivos: estes são o conteúdo e o objeto. O “conteúdo” do ato
administrativo é a substância da conduta voluntária em que o ato consiste. Mais
detalhadamente fazem parte do conteúdo do ato administrativo:
c.1) A conduta voluntária da Administração;
c.2) A substância jurídica dessa conduta, ou seja, a decisão
essencial por ela tomada;
c.3) Os termos, condições e encargos que acompanharem a decisão
tomada, isto é, as cláusulas acessórias;
c.4) Os fundamentos da decisão tomada.
c.5) O “objeto” do ato administrativo consiste na realidade
exterior sobre que o ato incide.
d)
Elementos funcionais: o ato administrativo comporta três elementos
funcionais que são a causa, os motivos e o fim:
d.1)
Causa: é a função jurídico-social de
cada tipo de ato administrativo (vertente objetiva) ou, noutra perspetiva, o
motivo típico imediato de cada ato administrativo (vertente subjetiva).
d.2)
Motivos: são todas as razões de agir
que impelem o órgão da Administração a praticar um certo ato administrativo ou
a dotá-lo de um determinado conteúdo. Na designação de motivos abrangem-se,
claro está, motivos principais e acessórios, motivos típicos e atípicos,
motivos próximos e remotos, motivos imediatos e mediatos (ou ulteriores),
motivos expressos e ocultos, motivos legais e ilegais.
d.3)
Fim: trata-se do objetivo ou
finalidade a prosseguir através da prática do ato administrativo. Há que
distinguir aqui o fim legal – ou seja, o fim visado pela lei na atribuição de
competência ao órgão da Administração – e o fim efetivo, real, prosseguido de
facto pelo órgão num dado caso.
13. TIPOLOGIA DOS ATOS
ADMINISTRATIVOS
Os atos
administrativos dividem-se em dois
grandes grupos: os atos primários e os atos secundários.
São “atos primários”, aqueles que versam
pela primeira vez sobre uma determinada situação da vida.
Os “atos secundários”, por seu turno, são
aqueles que versam sobre um ato primário anteriormente praticado têm por objeto
um ato primário preexistente, ou então versam sobre uma situação que já tinha
sido regulada através de um ato primário.
Dentro dos atos primários, há que distinguir entre
atos impositivos, atos permissivos e meros atos administrativos:
a)
Atos
Impositivos
- são
aqueles que impõem a alguém uma determinada conduta ou sujeição a determinados
efeitos jurídicos. Há que distinguir quatro espécies:
a.1) Atos de comando: aqueles que impõem a um particular a adoção
de uma conduta positiva ou negativa (se impõem uma conduta positiva - são
ordens, se impõem uma conduta negativa – são proibições;
a.2) Atos punitivos: são aqueles que impõem uma sanção a alguém;
a.3) Atos ablativos: são aqueles que impõem o sacrifício de um
direito;
a.4) Juízos: são os atos pelos quais um órgão da Administração
qualifica, segundo critérios de justiça, pessoas, coisas, ou atos submetidos à
sua apreciação;
b)
Atos Permissivos - são
aqueles que possibilitam a alguém a adoção de uma conduta ou omissão de um
comportamento que de outro modo lhe estariam vedados. Estes distribuem-se por
dois grandes grupos:
b.1) Os atos que conferem ou ampliam vantagens:
b.1.1)
Autorização: é o ato pelo qual um
órgão da Administração permite a alguém o exercício de um direito ou de uma
competência preexistente;
b.1.2)
Licença: é o ato pelo qual um órgão
da Administração atribui a alguém o direito de exercer uma atividade que é por
lei relativamente proibida;
b.1.3) Subvenção: pela qual um órgão da
Administração Pública atribui a um particular uma quantia em dinheiro destinada
a custear a prossecução de um interesse público específico;
b.1.4) Concessão: é o ato pelo qual um
órgão da Administração transfere para a entidade privada o exercício de uma atividade
pública, que o concessionário desempenhará por sua conta e risco, mas no
interesse geral;
b.1.5) Delegação: é o ato pelo qual um
órgão da Administração, normalmente competente em determinada matéria, permite,
de acordo com a lei, que outro órgão ou agente pratiquem atos administrativos
sobre a mesma matéria;
b.1.6) Admissão: é aquela pelo qual um
órgão da Administração pública investe um particular numa determinada categoria
legal, de que decorre a atribuição de certos direitos e deveres;
b.2) Os atos que eliminam ou reduzem encargos:
b.2.1) Dispensa: é o ato administrativo
que permite a alguém, nos termos da lei, o não cumprimento de uma obrigação
geral, seja em atenção a outro interesse público (isenção), seja como forma de
procurar garantir o respeito pelo princípio da imparcialidade da Administração
Pública (escusa);
b.2.2) A renúncia: que consiste no ato
pelo qual um órgão da Administração se despoja da titularidade de um direito
legalmente disponível;
Publicado por Adriana C. Pissarra